terça-feira, 10 de novembro de 2009

Violência nos Bancários do Maranhão: fatos, memória e contexto

É de Walter Rodrigues, jornalista paraense que mora em São Luís desde a década de 70, a versão sobre o que aconteceu no lançamento do livro de Palmério Dória, "Honoráveis Bandidos". É uma leitura imperdível!

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domingo, 8 de novembro de 2009
Violência nos Bancários: fatos, memória e contexto
Com licença. É tarefa para jornalista sério narrar, explicar e situar no contexto o conflito ocorrido dia 4 no Sindicato dos Bancários do Maranhão, durante o lançamento de um livro esquisito contra o senador José Sarney e sua turma. Como tive que me afastar por alguns dias do blogue, só agora posso atender à demanda dos leitores.

Os doze estudantes, cálculo médio de fontes confiáveis, que irromperam no auditório do sindicato gritando “Jackson ladrão, envergonha o Maranhão”, certamente não foram lá apenas para protestar ou lembrar a denúncia da Procuradoria Geral da República contra o ex-governador e correligionários, por suposta participação no bando Gautama (Operação Navalha, 2007). Queriam tumultuar e tirar o brilho da festa alheia, naturalmente imaginando que seriam expulsos do local com apenas alguns empurrões ― que ninguém dá a cara a tapa se puder evitar.

Desinformados. Deviam saber que no Maranhão você pode apedrejar a casa de Roseana Sarney, como ocorreu no intervalo do primeiro turno de 2006, sem sofrer represálias. Mas nem sonhe em perturbar manifestações da aliança PDT-PSDB e seus menores. O pau canta na hora. Episódios do recente governo Jackson, como o incêndio de prédios públicos, agressão policial ao ex-senador Chiquinho Escórcio e exortações oficiais à violência política definem um estilo. Flávio Dino e seus aliados petistas e outros provaram um pouco disso na campanha municipal do ano passado, quando o candidato do PCdoB enfrentou João Castelo (PSDB), apoiado por Jackson.

Guerra de panfletos

Quando os jovens sarneístas chegaram ao local, havia umas 150 pessoas no auditório, segundo cálculos moderados. Os manifestantes gritaram seus slogans e espalharam exemplares do livreco Corrupção: bandidos navalhados, espécie de contrapanfleto em resposta ao Honoráveis bandidos servido aos presentes pelo jornalista Palmério Dória.

Uma dúzia de pessoas comuns, desarmadas e praticamente indefesas, entre as quais várias moças, só se estivessem loucas seriam capazes de iniciar um quebra-quebra ou provocar conscientemente uma pancaria em tamanha desvantagem.

Dois ou três delas, segundo correligionários jackistas, lançaram ovos. Isso não se vê nas imagens divulgadas até agora, nem mesmo sinais de ovos quebrados pelo chão ou na roupa dos presentes. Mas pode ter ocorrido. Nesse caso os lançadores postaram-se no fundo da sala e foram os primeiros a dar o fora quando a barra pesou.

Já as moças e rapazes que se aproximaram da mesa diretora dos trabalhos, onde Palmério discursava sobre honestidade, observado carinhosamente pelo ex-governador José Reinaldo e outros heróis do livro dele, limitaram-se a dizer palavras de ordem e a jogar panfletos. Estes foram cercados e espancados com violência abusiva e desnecessária. Não precisva tanto, nem isso faz ou fazia parte dos costumes locais, pelo menos na capital. De mais a mais, foi, digamos assim, uma briga de irmãos.

A bolsa ou a vida

Examinando-se as imagens de vídeo postadas no Youtube e no próprio saite do Jornal Pequeno, porta-voz dos anti-sarneístas e anti-lulistas no Maranhão, percebe-se claramente o que aconteceu. Os sarneístas, após alguns minutos, deixaram o local correndo e debaixo de pancada, perseguidos por seus algozes.

Uma moça baixinha foi cercada e agredida por três jackistas, que até lhe tomaram a bolsa. No relato faccioso do JP, “Uma das manifestantes, identificada como Ana Paula Ribeiro, engalfinhou-se com um dos organizadores do evento e, ao sair correndo, acabou deixando sua bolsa, com documentos pessoais, no meio do auditório”. Veja as imagens.

Quem adiante mexeu na bolsa da moça sem nenhum constrangimento, exibindo-lhe o conteúdo como um troféu, foi o deputado federal Domingos Dutra. Para esse dissidente petista aliado aos tucanos no Maranhão, a cédula de identidade de Ana Paula, líder estudantil ligada ao secretário estadual da Juventude, Roberto Costa, é a “prova do crime”, de que o “ato terrorista”, como o chamou, foi manipulado pelo secretário.

Ou pelo próprio senador Sarney, como mudaria no dia seguinte, na Câmara, aproveitando para transformar os 10 ou 12 manifestantes ― “no máximo quinze”, segundo as versões mais condescendentes ― em quarenta pugilistas.

Do JP: “Dutra afirmou que o presidente do Senado enviou uma tropa de choque de cerca de 40 pessoas para invadir o Sindicato dos Bancários e tentar impedir o evento, munidos de pedras e ovos”.

Pedras? Nenhuma imagem de qualquer jornal ou saite mostra algum jackista ferido, machucado ou reclamando de pancada ou pedrada. Parecem todos, pelo contrário, muito felizes depois da briga desigual. Querendo, confira no vídeo outra vez.

Já no saite sarneísta iMirante temos as imagens de manifestantes feridos e queixando-se de dor. Veja aqui.

Bandos estudantis

Esses doze infelizes que meteram a cara em falso naquela noite pertencem à União Municipal de Estudantes Secundaristas (Umes) e à Federação da Juventude Maranhense (Fejuma). Leitores desteColunão estão cansados de saber do que se trata. São organizações contaminadas pelo clientelismo e, em última análise, pela corrupção, inclusive no sentido mais amplo de que degeneraram e perderam a própria identidade.

A mãe de todas elas, a Umes, caiu primeiramente sob a influência do então deputado e depois governador e senador e atual vice-governador João Alberto, PMDB, ex-PDS, outrora ligado também ao PCB. Uma das jovens criaturas de João Alberto foi o atual vereador Ivaldo Rodrigues (PDT), adiante cooptado pelo esquema Jackson.

Como prefeito e como governador, Jackson usou e abusou da corrupção estudantil. Em 2000, ano em que Jackson conquistou seu terceiro mandato municipal ― aliado ao PFL de Roseana na famosa coligação champanhota ― a Umes já se havia transformado num covil de bandos rivais, uns correndo atrás dos outros em torno do cofre, a gritar pega ladrão. “Umes é caso de polícia (e de política)”, registrou o Colunão de 5/11/2000 (vejaaqui).

Tem origem na Umes o famigerado Weverton Rocha, ex-secretário da Juventude no governo Jackson. Espécie de afilhado e herdeiro político do ex-governador, esse jovem precoce maneja a pecúnia pública com uma ousadia de assombrar os veteranos.

O ex-pedetista Tadeu Palácio, atual secretário de Turismo de Roseana, que foi vice e sucessor de Jackson na prefeitura, mais ou menos que pacificou os ânimos na Umes repartindo o pão.

Tadeu, Ivaldo e Weverton estimularam a criação de novas “entidades estudantis”, tão agressivas quanto famintas. Usou-as contra o DCE da Universidade Federal do Maranhão quando este, bem fraquinho, tentou reagir às novas regras da “meia- passagem” combinadas pelo prefeito com os empresários de ônibus. Essa mesma “militância espontânea” desafiou professores grevistas inimigos da Lei do Cão no governo Jackson.

Chávez patetando

Quando Hugo Chávez veio ao Maranhão patetar ao lado de Jackson, do MST e de notórios direitistas como os secretários Aderson (Maluf) Lago e Lourenço (Sylvio Frota) Vieira da Silva ― ocasião em que a imprensa jackista-governista cumpriu direitinho a instrução de suspender temporariamente a habitual fuzilaria antilulista e antichavista ― os sarneístas protestaram acionando o grupo dessa mesma AnaPaula cuja bolsa o deputado remexeu com sem-cerimônia de lanceiro. A qual, a propósito, assim como Ewerton, também andou envolvida em desvio de verba numa dessas entidades fantasmas.

Portanto não é de estranhar que agora, com a cassação de Jackson e o retorno de Roseana, Ana Paula esteja mais ousada e que a Umes de Jackson e Tadeu passe a ser a Umes de Roseana, visto que o prefeito João Castelo (PSDB), que tem lá os seus caprichos, nunca deu trela a essa gente.

Um pior que o outro

Marco d’Eça, colunista do iMirante (da família Sarney) afirma que a manifestação anti-Jackson nos Bancários foi obra de Roberto Costa, atual secretário da Juventude, a quem chamou de “idiota” por haver ajudado a “promover” o lançamento dos inimigos de Sarney. Diz também que Roberto Costa é “igual a Weverton”.

Se foi Costa quem enviou doze gatos pingados para o sacrifício, sem nem mesmo cuidar do suporte midiático prontamente acionado pelos adversários após a confusão, será mesmo um tanto idiota, sim, além de sadomasoquista. Ele nega, diz que foi tudo idéia da Umes, tão somente.

Quanto a ser “igual a Weverton”, nem de longe. Pelo menos por enquanto. Só quando provarem que esse Costa, como aquele Weverton, meteu a mão no cofre da Umes, fez acordo de restrição de direitos com o Ministério Público para não ser condenado por peculato, criou entidade fantasma em nome da própria mãe para desviar recursos externos, e ainda afrontou a comunidade ao sumir com o dinheiro da reforma de um ginásio de esportes, o Costa Rodrigues, cujas ruínas o denunciam no centro da cidade. (Mas sim: e o Ministério Público, que nunca termina essa “apuração” do ginásio Costa Rodrigues?).

Seja lá como for, pouca gente acredita que os estudantes sarneístas, os líderes, sejam mais ou menos indiferentes a grana que a militância ou clientela jackista-reinaldista equivalente.

Dizem que os jovens são o futuro da nação. Danação. É isso aí.

Amigo do peito

Informa o Jornal Pequeno que o “evento” nos Bancários foi organizado pelo conhecido jornalista Marcos Nogueira.

Trata-se de um “amigo pessoal” do senador José Sarney. Pelo menos foi assim que ele se identificou em 2002, logo depois do sarneísmo ter ganho mais uma, com a vitória de José Reinaldo (PFL) sobre Jackson Lago (PDT).

Naquele ano (ou terá sido no começo de 2003), Nogueira tantas fez que convenceu Sarney a comparecer ao aniversário dele, na área de convivência do condomínio Canopus. Foi o bastante para que plantasse no noticiário de meia página que se reservou no jornalFolha do Maranhão, do qual fora feito editor-chefe pelo deputado sarneísta Manoel Ribeiro, o seguinte (cito de memória, mas a parte grifada é literal):

“A festa foi prestigiada por destacadas personalidades da política local, entre as quais o senador José Sarney, amigo pessoal do jornalista".

Nogueira é cearense. Palmério é paraense. Nada de preconceitos contra o Maranhão.

De coração

O trabalho que me deu pesquisar e lincar tanta informação, tratando de um assunto afinal de contas menor, ofereço à inteligência do leitor honesto e independente. Se, por sua vez, você se der ao trabalho de ler tudo e tudo analisar, dou-me por recompensado.

Walter Rodrigues | 22:48

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